Pular para o conteúdo principal

SOLIDÃO AMERICANA (Edu)



por — Eduardo Muylaert

Se sua vida anda meio vazia
nessa hora da terrível pandemia
experimente uma revista literária
tipo a New York Review of Books.
Se não conseguir achar um companheiro (não é fácil),
sua solidão, ao menos, pode virar poesia.

Punk, alternativa, bi/pansexual
Mulher asiática procura amor durante a biocrise
Preguiçosa poeta no final dos seus 20 anos,
Millenial, sardônica e irreverente.
Você: incisivo, experiente, carinhoso, sem Covid-19. 

Vamp-me via zoom ou facetime
Ponha minha alma em fogo
Instagrame meu ego impaciente
Hashtague meu desejo.
Nossos lábios ainda não se tocaram,
tweet me, baby, tout de suite! 

Sou anticorpo! Quem é você?
Você também é Anticorpo?
Como é vergonhoso ser o antígeno que
ingrato - como uma taturana, engana
seu anfitrião o dia inteiro a imitar você!
Mulher, 70 anos, NY, procura /gosta de homem
afetuoso que aprecie livros e música.

Meu pombo correio traz uma mensagem
para libertar seu coração em quarentena.
Mande um e-mail, olhares por zoom:
encontro ao luar depois do lockdown.
(Mulher do Maine quer homem alegre).

Viúva de autoridade
Procura se livrar dos bajuladores.
Coloque seu poema mais lascivo.

Trabalhador em saúde pública 
procura mulher judia e prática
para rir do chefe após o trabalho
sem usar máscaras. 

Advogada adorável, aposentada,
de tendência liberal,
pronta para se divertir,
procura um cavalheiro
com a mesma visão de mundo.
70, Nova York, Long Island.

Engate no meu trailer
Procuro sênior sofisticado e brilhante
Que goste de observar as estrelas!

Médica bonita e poética, de NYC,
mignon, com um carro esporte azul,
procura um parceiro com garagem (65–75)
para poderem percorrer o país de automóvel. 

Avó sino-russa, jovem aos 60 anos,
procura homem gentil de 60-70, 
saudável e com renda própria, 
com quem possa compartilhar alguma vida
carreira. taichi, teatro, guerra às drogas, 
meditação budista, e mais ainda.

Estudante de graduação, eclética,
baixinha, vivendo em Nova York,
tem passaporte e aceita propostas
indecentes de cavalheiros experientes. 

O amor mora aqui. Procuro
 parceiro homem, leal, (67–77).
Sou mulher negra, bonita, boa profissional,
que luta por justiça social e ama as artes.
Mesma etnia ou diferente, tanto faz.

Advogado em Nova Iorque, lido e viajado,
vigoroso, eclético, bom ouvinte.
Mas a vida é mais que isso.
Procuro companheira para compartilhar a aventura.
Gosto de mulheres que falam francês.

Homem dinâmico, professor,
no final dos seus 60, perto da aposentadoria,
procura compatriota para viver plenamente,
amar gentilmente e, pelos próximos anos,
rir regularmente.

Viúva americana vivendo em Praga, 
tipo loira , pequena e jornalista,
autora de um livro sobre a Primeira Grande Guerra, procura cavalheiro cultivado, na casa dos 70,
para viajar e sabe lá o quê mais. 
Saia dos roteiros conhecidos, ofereço
conversas, dança de salão, livros e gatos.
Vamos trocar e-mails e fotos

Viúva de PhD, quente, atraente e espirituosa,
no final dos seus 60, vivendo em South Bay / San Francisco, procura companhia inteligente,
culta, atenciosa, antenada, para filmes, concertos, caminhadas, viagens, e uma forte conexão amorosa.

Se você se interessou por uma dessas propostas, 
busque o link no site da revista, seção classificados.
Também pode mandar a sua própria. Mas se nada der certo, há uma possível solução, na mesma página:
Paris, St. Germain, último andar encantador, agradavelmente mobilado, vista, elevador, até 3 pessoas.





Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Anything else I can help you with, ma´am? – parte 3

  ETEL FROTA Em Auckland, passo por debaixo do wharenui , o enorme portal da casa comunitária de encontros māori, de onde ressoa um delicado canto feminino de boas-vindas. A viagem foi dura, mas estou na Nova Zelândia, onde tudo sempre dá certo. Cara a cara com a senhora da imigração, já cheguei me justificando. Sorry, tinha tido problemas no preenchimento da NZeTA, primeiro, e depois na NETD. Fui depositando no balcão o celular aberto no formulário parcialmente preenchido, o certificado de vacinação impresso, o PCR negativo, passaporte. Muito ansiosa, esbarro nas palavras em meu inglês enferrujado pelo confinamento. [Aliás, tenho percebido que enferrujadas estão minhas habilidades de comunicação, mas isto não é assunto para agora.] Com um sorriso protocolar, ela sequer olhou para meu calhamaço.   Tranquilamente, me estendeu uma folha de papel, um xerox mal ajambrado, onde eu deveria marcar um xis declarando estar vacinada e outro confirmando ter tido um PCR negativo até 48 horas

NO TÚMULO DO POETA RENÉ CREVEL (edu)

Um poema em prosa de EDUARDO MUYLAERT Da minha casa na avenue de Chatillon que hoje é a avenue Jean Moulin eu podia ter ido a pé em pouco tempo ao descuidado cemitério de Montrouge Acabei nunca indo procurar — na quadra dezenove o túmulo discreto de uma família burguesa singelo granito rosa onde repousam serenos os restos do inquieto poeta René Crevel Se não dou certo em nada me mato — tinha dito leal, cumpriu a promessa — só mais tarde acabou reconhecido cultuado pranteado como poeta e escritor surrealista A vida teve cheia de intempéries tinha ainda catorze anos quando a mãe que só fazia blasfemar contra o cadáver o arrastou para ver o pai dependurado Sem ilusões. Fazia amor com homens e mulheres vivia com a cruel tuberculose — a peste branca e tinha amigos em diversos sanatórios além do peito, doíam muito os rins e a vida Tinha uma amante argentina, —   Condessa Cuevas de Vera a quem deixou a última mensagem — “Favor

QUARENTENA, DIA 62

Por DANIELA MARTINS 16/5 - QUARENTENA, DIA 62. Com quase 4.700 vidas perdidas, o estado de São Paulo superou a China em número de mortes por Covid-19. O Brasil perdeu hoje mais 816 cidadãos para o vírus. A melancolia do dia frio foi aplacada pela live que rolou num dos terraços do bairro, acompanhada e aplaudida pelos vizinhos. Eu e a Teca acordamos bem cedinho e tomamos café da manhã juntas. Os irmãos mais velhos aproveitaram para dormir até tarde, livres das videoaulas. Fiz arroz de carreteiro para o almoço, enquanto sonhava acordada com um piquenique num gramado qualquer. Fiquei com saudades dos nossos piqueniques deliciosos no Parque da Cidade, em Brasília, e no Jardim Botânico aqui de São Paulo, do meu famoso sanduíche de atum com pepino crocante, que nunca faltava. Parece tudo tão distante agora... Que bom que temos essas pequenas lembranças de dias em que fomos felizes sem nenhuma razão especial... Marcamos uma sessão de cinema na sala e eu preciso ajeitar tudo. Va