- Por J. MARCELO ALVES
O presidente dos EUA disse ter pedido a executivos da indústria farmacêutica: "Do me a favor, speed it up, speed it up" (façam-me um favor, acelerem, acelerem). Ele se referia ao desenvolvimento de uma vacina contra o SARS-CoV-2, o novo coronavírus responsável pela doença que está fazendo a festa pelo mundo, a Covid-19.
Acontece que o desenvolvimento de drogas, e especialmente vacinas, não pode ser apressado tão facilmente; a vida não é filme de Hollywood. Não se está falando de fabricar um novo modelo de celular ou pneu de caminhão. As chamadas leis da natureza estão aí e não podem ser ignoradas. O editor-chefe da revista Science, uma das mais importantes do mundo há mais de 100 anos, explica bem ao presidente dele e a quem mais quiser ler em um ótimo editorial, então não vou me alongar mais nisso agora.
Nos EUA, a ciência tem estado sob ataque nos últimos tempos. Lá, desmontaram partes do sistema de controle de pandemias e vêm cortando verbas para pesquisa. Isso mesmo com os cientistas que trabalham para o próprio governo insistindo que era só questão de tempo até que algo como a Covid-19 acontecesse e que era necessário estar preparado. Aconteceu e ainda não sabemos como vai acabar.
E aqui, no Brasil, o que dizer? Para começar, não sonhamos em ter mesmo uma pequenina fração da verba e da estrutura americanas. Ainda assim, piorando tudo, o pouco que temos está sendo destruído com mais gosto ainda que no caso estadunidense. Educação e ciência nunca foram grande prioridade de nossos governos, para ser justo, mas hoje em dia essas áreas são tratadas ativa e abertamente como inimigas. Sem pudor nem disfarce.
Sabe aquelas descobertas tão bonitas que aparecem na TV e nas redes sociais e que todo mundo fica emocionado batendo palminha e postando coraçãozinho? Tudo obra de bolsistas CAPES, CNPq, Fapesp (e outras agências estaduais que porventura ainda estejam vivas) fazendo seu trabalho quase sempre em universidades públicas, com a orientação e apoio de professores e funcionários --ambos servidores públicos. Uns são maconheiros fazendo balbúrdia, segundo o Ministro da Educação; os outros, parasitas, segundo o Ministro da Fazenda.
São os bolsistas, a maioria com pagamentos (CAPES e CNPq) sem reajuste desde 2013, que agora correm para ser voluntários em laboratórios e fazer os testes de biologia molecular de detecção do novo coronavírus. Ou que, em vez de ficar em casa, se arriscam saindo para fazer pesquisa às pressas, tentando resolver a crise o quanto antes.
Falta gente especializada e ainda assim esses especialistas e sua formação estão sendo atacados moral e financeiramente. A cada ano o governo corta mais o número de bolsas e as verbas para projetos de pesquisa. A cada declaração infeliz, algum ministro bota a população um pouco mais contra esses profissionais.
Isso que é povo de visão. Melhor não ficar criando muito gado para exportação ou vai faltar capim para todos nós, se continuarmos assim.
Então, faça-me o favor: quando o vírus bater à sua porta, mantenha a coerência e, em vez de ir implorar para que os parasitas (SUS, Sucen, universidades, hospitais públicos, institutos de pesquisa etc.) e maconheiros o salvem, somente comece a rezar. Só que não ouça algumas de nossas "autoridades" federais; reze em casa mesmo.
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