Pular para o conteúdo principal

O VÍRUS DO DIVÓRCIO



- Por EDUARDO MUYLAERT

Uma preocupação repentina começou a incendiar o mundo: o corona vírus vai acabar com os casamentos? Claro, a questão só se põe aos que esperam sobreviver à provação.  E os solteiros têm outro tipo de problemas, que também não são pequenos.

O primeiro alerta veio do chinês Global Times. A cidade de Xian estaria experimentando um pico de divórcios, como repercussão do COVID-19. Os cartórios reabriram em 1° de março e precisaram criar um sistema de agendamento por telefone, para dar conta desse novo surto. Os conflitos subjacentes não resistiram a um mês de confinamento. Alguns casais, entretanto, depois se arrependeram decisão tomada de impulso e querem voltar a se casar.

Mesmo os bovinos, em estado de confinamento, sofrem de violação de seu espaço, o que resulta em aumento de agressividade e estresse. Ratos de laboratório passaram a engordar, perdem imunidade, se entediam e passam a fazer sexo acima da média. Parece que os humanos em monogâmia forçada  fazem menos.

Os primeiros a repercutir a matéria foram os jornais italianos, apontando que a China registrou um aumento enorme dos casos de violência doméstica. Cônjuges que não têm a sorte de morar numa casa grande, ou de dispor de dois banheiros, podem se descobrir reciprocamente insuportáveis.

O New York Times endossou a preocupação, citando um psicanalista para quem a taxa de divórcios vai crescer também nos Estados Unidos. As pessoas se policiam mutuamente e brigam mais. Uma famosa advogada de família considera que a experiência do confinamento pode ser devastadora e lembra que, após as férias de inverno, o número de divórcios aumenta muito, especialmente em janeiro.

Na velha e querida Inglaterra, reporta o Mail Online, uma advogada que atende clientes vip como Madonna, Paul McCartney e o Príncipe de Gales, também prevê um aumento grande de casos naquele País.

Já a americana Newsweek foi mais otimista, sua matéria pretende dar dicas para evitar que a crise termine em divórcio. Cita um artigo da Lancet que aponta fatores que aumentam o estresse: muito tempo de isolamento, medo de infecção, tédio, compras inadequadas, informação idem, e ainda (talvez especialmente) perdas financeiras.

A aposta é que as uniões com bases sólidas vão durar e até florescer, mas que onde há falta de respeito e comunicação, a vaca pode ir para o brejo.

E nós? Em períodos normais, o Brasil tem cerca de 350 mil separações por ano, contra perto de um milhão de casamentos. Como se vê, o superávit ainda é bastante positivo.

Se a quarentena não for pacífica, o divórcio pode ser. Até por escritura pública, em Cartório, se completa, se não houver filhos menores. Se houver bom senso, os danos da separação serão menores. Mas nem sempre é assim,

Agora, se houver bom senso, mas bom senso mesmo, é preciso reconhecer que estamos vivendo uma situação extrema, que podemos superar nos adaptando ao que podem ser novos paradigmas para o mundo.

Para os homens, participar dos trabalhos domésticos e conviver mais com os filhos pode ser uma grande oportunidade de experimentar um modo novo de vida, com mais gratificações do que o anterior. De todo modo, precisamos banir a violência doméstica e aprender a conviver com mais consideração para com todos.

E, antes de falar em divórcio, pensem bem. Como estão vivendo os solteiros, que não tem ninguém com quem compartilhar esse período? Nem um parceirinho ou parceirinha para sentar ao lado na televisão, discutir como está o tempo lá fora, ou mesmo atormentar um pouquinho, que ninguém é de ferro.



Comentários

  1. É uma realidade! Muitos casais que já vinham em isolamento conjugal, mal estar conjugal mascarado pelo stress do trabalho, trânsito, depressão, insuportabilidades deslocadas, com a Pandemia, estão tendo que desmascararem no isolamento doméstico suas verdades: quantos anos sem tesão, quantos anos sem desejo de conviviu, quantos anos sem diálogo. Quem sabe, reste vestirem as máscaras mesmo dentro de casa para não morrerem de vírus ou tédio?

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Anything else I can help you with, ma´am? – parte 3

  ETEL FROTA Em Auckland, passo por debaixo do wharenui , o enorme portal da casa comunitária de encontros māori, de onde ressoa um delicado canto feminino de boas-vindas. A viagem foi dura, mas estou na Nova Zelândia, onde tudo sempre dá certo. Cara a cara com a senhora da imigração, já cheguei me justificando. Sorry, tinha tido problemas no preenchimento da NZeTA, primeiro, e depois na NETD. Fui depositando no balcão o celular aberto no formulário parcialmente preenchido, o certificado de vacinação impresso, o PCR negativo, passaporte. Muito ansiosa, esbarro nas palavras em meu inglês enferrujado pelo confinamento. [Aliás, tenho percebido que enferrujadas estão minhas habilidades de comunicação, mas isto não é assunto para agora.] Com um sorriso protocolar, ela sequer olhou para meu calhamaço.   Tranquilamente, me estendeu uma folha de papel, um xerox mal ajambrado, onde eu deveria marcar um xis declarando estar vacinada e outro confirmando ter tido um PCR negativo até 48 horas

NO TÚMULO DO POETA RENÉ CREVEL (edu)

Um poema em prosa de EDUARDO MUYLAERT Da minha casa na avenue de Chatillon que hoje é a avenue Jean Moulin eu podia ter ido a pé em pouco tempo ao descuidado cemitério de Montrouge Acabei nunca indo procurar — na quadra dezenove o túmulo discreto de uma família burguesa singelo granito rosa onde repousam serenos os restos do inquieto poeta René Crevel Se não dou certo em nada me mato — tinha dito leal, cumpriu a promessa — só mais tarde acabou reconhecido cultuado pranteado como poeta e escritor surrealista A vida teve cheia de intempéries tinha ainda catorze anos quando a mãe que só fazia blasfemar contra o cadáver o arrastou para ver o pai dependurado Sem ilusões. Fazia amor com homens e mulheres vivia com a cruel tuberculose — a peste branca e tinha amigos em diversos sanatórios além do peito, doíam muito os rins e a vida Tinha uma amante argentina, —   Condessa Cuevas de Vera a quem deixou a última mensagem — “Favor

QUARENTENA, DIA 62

Por DANIELA MARTINS 16/5 - QUARENTENA, DIA 62. Com quase 4.700 vidas perdidas, o estado de São Paulo superou a China em número de mortes por Covid-19. O Brasil perdeu hoje mais 816 cidadãos para o vírus. A melancolia do dia frio foi aplacada pela live que rolou num dos terraços do bairro, acompanhada e aplaudida pelos vizinhos. Eu e a Teca acordamos bem cedinho e tomamos café da manhã juntas. Os irmãos mais velhos aproveitaram para dormir até tarde, livres das videoaulas. Fiz arroz de carreteiro para o almoço, enquanto sonhava acordada com um piquenique num gramado qualquer. Fiquei com saudades dos nossos piqueniques deliciosos no Parque da Cidade, em Brasília, e no Jardim Botânico aqui de São Paulo, do meu famoso sanduíche de atum com pepino crocante, que nunca faltava. Parece tudo tão distante agora... Que bom que temos essas pequenas lembranças de dias em que fomos felizes sem nenhuma razão especial... Marcamos uma sessão de cinema na sala e eu preciso ajeitar tudo. Va