Por EDUARDO MUYLAERT
Os homens e mulheres de imprensa, que estão no terreno, são nossos olhos e ouvidos, não podemos deixar que sejam feridos.
Domingo, que costumava ser o dia do Senhor, virou o dia do Apocalipse. Vimos jornalistas sendo agredidos por manifestantes, em frente ao Palácio do Planalto. Bolsonaro estava visivelmente animado com os protestos contra o Congresso e o Supremo. Sentindo-se afinal apoiado, declarou que seu governo chegou “ao limite”, seja lá o que isso quer dizer. Quanto à agressão, se houve, só pode ser obra de infiltrados, ou malucos.
Já vimos essas cenas antes. A agressão física foi uma das armas que Hitler usou para implantar o nazismo na Alemanha. Quantas vezes o cinema já mostrou as cenas de milícias agredindo pessoas nas ruas de Berlim, nos anos 1930? Compostas por desempregados, ex-militares, desajustados de qualquer espécie e até criminosos comuns, espalhavam o terror junto aos inimigos de Hitler, por meio da surra, da tortura e do assassinato, registra uma aula de história (UOL).
Time, Newsweek e outras revistas americanas publicaram na época fotos desses ataques, mostrando também cidadãos americanos agredidos por rir de piadas antinazistas, ou se recusar a saudar a bandeira de Hitler, ou só porque pareciam judeus. Mas a reação americana tardou muito.
Lügenpresse, imprensa mentirosa, era a expressão usada pelo partido Nacional-Socialista para atacar a imprensa. Possivelmente sem o saber, aliados de Trump começaram a usar esse mote na campanha de 2016. Na Alemanha, lügenpresse fora definida por um júri, em 2014, como a pior palavra do ano, por ser “especialmente pérfida”.
Como candidato, e depois como presidente, Donald Trump não só permitiu que esse sentimento aumentasse, como o instigou e encorajou, escreveu Margaret Sullivan no Washington Post. Pior, o desprezo de Trump pela imprensa infectou não apenas a sociedade americana, mas também uma parte do mundo.
A violência política é definida por Dirk Schumann, no seu clássico sobre a Alemanha de Weimar, como o exercício de coerção física exercida coletivamente e dirigida a objetos, pessoas ou grupos que representem uma ideia adversa. Tais ataques, que visam o sistema político como um todo, podem ser planejados, ou ocorrer em situações de confronto, desencadeados por pessoas “normais” (homens e mulheres), ou membros de milícias ou forças de ordem.
A demonização dos jornalistas precisa terminar, declara Leon Willems, diretor da organização Free Press Unlimited. Ele lembra que as ameaças nas redes sociais visando a imprensa são diárias, especialmente contra mulheres, e que os jornalistas têm sido alvo de agressões e roubo de equipamentos. Essa violência ataca um dos pilares fundamentais da democracia, e os políticos que incitam por palavras também devem ser tidos como responsáveis.
E agora? Não podemos fechar os olhos. A história nos mostra onde essa violência pode chegar. Os homens e mulheres de imprensa, que estão no terreno, são nossos olhos e ouvidos, não podemos deixar que sejam feridos. Precisamos deles para continuar sabendo dos fatos, avaliar as situações, e para que a democracia continue a prevalecer. Ninguém vai rasgar a Constituição. Esse é o nosso limite
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